Internação involuntária, uma alternativa?
No Brasil o consumo do crack já é o maior problema de saúde pública do país, com mais de 1% da população considerado dependente, segundo o Dep.Federal Osmar Terra PMDB/RS, autor do PL 7663/2010 que prevê a internação involuntária de usuário ou dependente de drogas.
Uma das críticas à proposta é de que ela poderia iniciar um processo de limpeza social nas ruas, retirando os usuários de crack que se juntam nas cracolândias.
Sobre o tema, entrevistamos a Deputada Federal PT/DF Érika Kokay, membro da Comissão de Direitos Humanos, que gentilmente nos atendeu através de sua assessoria.
COMPANHEIROS DO VERDE - Dep. Érica, como tem se desenvolvido a questão da internação involuntária dentro da Câmara Federal?
ÉRIKA KOKAY - A legislação atual já prevê a internação compulsória (mediante decisão judicial), assim como a internação involuntária, que parte de uma decisão da família e da avaliação de uma junta médica, e a internação voluntária. Mas na legislação atual, a internação compulsória é encarada como o último recurso, só utilizada depois de uma série de avaliações, e dentro de uma lógica garantista, que visa proteger os direitos e a autonomia da pessoa.
CV - O distrito Federal tem estrutura para atender tantas internações num período longo de tratamento?
EK - Definitivamente não. A rede do Distrito Federal não tem capacidade nem mesmo para atender as pessoas que buscam a internação de forma voluntária. Segundo os dados mais recentes do Ministério da Saúde, de 2012, a rede de atenção psicossocial do DF é a mais precária do país, com uma média de 0,25 CAPS para cada 100 mil habitantes. Para se ter uma ideia, isso representa pouco mais de um terço da média nacional, que é de 0,72 CAPS para 100 mil habitantes. Hoje, a melhor experiência que eu conheço no Distrito Federal de combate à drogadição é o Projeto Giração, patrocinado pela Petrobrás, e que funciona numa base oposta à da internação compulsória. Nesse projeto, busca-se que a pessoa crie vínculos, relações de confiança, que a ajudem a querer largar a dependência de forma autônoma. Já na internação compulsória, a pessoa é novamente assujeitada: ela é tratada como um ser sem autonomia para decidir, para tomar conta de si própria.
CV - Qual a sua opinião acerca da polêmica em torno da suposta "limpeza social das ruas" em vésperas de grandes eventos, com as medidas propostas pelo Projeto de Lei 7663/2010?
EK -Esse projeto, que inclusive foi retirado da pauta de hoje, está baseado numa lógica de recrudescimento da punição, além de ir no sentido de borrar as fronteiras entre os usuários e os traficantes, facilitando inclusive a criminalização dos primeiros. O PL dispõe, inclusive, que qualquer servidor público terá capacidade para realizar a internação compulsória. Além de impraticável e absurdo, essa medida tem como finalidade realizar uma verdadeira limpeza étnico-social nas ruas das cidades, como se a sociedade preferisse não ver algo que ela própria ajudou a criar. A drogadição, na minha opinião, tem raízes profundas no modo de ser da nossa sociedade. Não se trata de um fenômeno isolado ou passageiro. Essa forma de lidar com a drogadição, recrudescendo as medidas punitivas, está falhando. A população carcerária brasileira é uma das que mais cresce no mundo, e caminha para se tornar a terceira maior do mundo até 2016. Desses, 26% foram encarcerados por envolvimento com drogas. E não há nenhum dado atestando a diminuição do consumo. Na outra mão, uma política bem sucedida é a de combate ao tabagismo, que não lida com a repressão.
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